31.10.11

SÉRIE - Futebol para todos: muito além do grito de gol

2) Os contratos de transmissão no Brasil

Em 2011 os clubes brasileiros de futebol da Série A firmaram novo contrato de transmissão dos jogos do Campeonato  Brasileiro com a TV Globo (leia-se: Globo, SporTV e Premiere Futebol Clube, o pague-para-ver) que vale para os anos de 2012 a 2014. 

O contrato atual não corresponde às orientações e determinações do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) do ano passado e, por isso, a assinatura estipulada para esse ano gerou expectativas, já que as emissoras interessadas (Record e Rede TV!, por exemplo) sentiram-se, enfim, protegidas e seguras para negociarem. 

Um compromisso firmado entre o Cade, o Clube dos 13 (até então o representante dos clubes) e a própria Globo pôs fim à cláusula de preferência. Com ela a Globo mantinha o poder de oferecer os valores pela transmissão por último, o que sempre impedia a concorrência das demais emissoras e feria "a igualdade entre os concorrentes", conforme comunicado que você pode ver aqui.

Uma briga política nos bastidores do Clube dos 13 (C13) e da CBF (a Confederação Brasileira de Futebol) foi constantemente comentada e noticiada por jornalistas e blogueiros, indicando que nem sempre o interesse financeiro dos clubes esteve em primeiro lugar. Alguns dirigentes garantiam apoio total ao já isolado Fábio Koff (presidente do C13) enquanto a maioria já havia assinado com a Globo. 

O acordo capitaneado pelo CADE representava maior liberdade e garantia econômica aos clubes, embora a imensa maioria estivessem/estejam presos a empréstimos feitos junto ao C13 e a antecipações de valores solicitados junto à Globo. Além disso, mesmo extremamente atrasado, o acordo finalmente deixava a disputa pelos direitos de transmissão mais justa. O blog do Juca Kfouri publicou a carta-convite recebida pelo SBT para participar do processo de escolha e nela, surgiram importantes novidades. Veja a carta neste post.

Uma das novidades era a preferência pela venda segmentada às diferentes mídias. Acreditava-se que fazendo leilões para diversos interessados os clubes arrecadariam mais.

Outro ponto, o mais importante, era que somente para a televisão aberta o C13 exigia R$500.000.000,00 por temporada (total de R$1,5 bi pelo triênio), valor já superior ao que a Globo havia pago pelo "pacotão" (TV aberta e fechada, pague-para-ver, Internet e telefonia móvel) das temporadas de 2009 a 2011: R$1,4 bi, segundo comunicado da própria emissora disponível aqui.

Por fim, a Record estava empenhada não apenas em pagar caro, mas também em usar o futebol para competir fortemente com a Globo: as transmissões dos jogos iriam para o horário nobre, batendo de frente com o Jornal Nacional e novela das nove.

Todo o esforço do C13 foi por água abaixo, pois a Globo optou por negociar diretamente com os clubes, o que foi inicialmente vantajoso para os grandes, mas parece alterar pouco a relação de dependência com a emissora dos Marinho. Segundo informações de Paulo Vinícius Coelho, o PVC, em seu blog no sítio da ESPN Brasil, os valores negociados clube a clube possibilitaram aumentos pontuais, mas que dificilmente cobririam o contrato do C13.

Os supostos valores são, segundo apuração da Folha de S. Paulo, de 43 para 100 milhões de reais para o Flamengo e de 21 para 55 milhões de reais para o Botafogo. Os dez maiores (supostos) contratos podem ser vistos nesse gráfico.

Todo a disputa, que teve a Rede TV! como única emissora a enviar proposta ao C13 após desistência da Record, foi até o mês de maio quando, enfim, a Globo já havia garantido novamente a compra do "pacotão".

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blog Pra Escrever apresenta uma série de postagens sobre as negociatas e politicagens do futebol brasileiro, reunindo publicações e críticas recentes da imprensa.

1) O jogo em que Ricardo Teixeira é o capitão.
2) Os contratos de transmissão no Brasil.
3) A história se repete. Chegou a hora de aprender com os hermanos.   

26.10.11

SÉRIE - Futebol para todos: muito além do grito de gol

1) O jogo em que Ricardo Teixeira é o capitão

Ricardo Teixeira concentra muito poder no futebol brasileiro, além de ser bastante próximo de nomes como o brasileiro João Havelange (presidente da FIFA de 1974 até 1998) e do suíço Joseph Blatter (sucessor de Havelange, com mandato até 2015).

Presidente da CBF há 22 anos, Ricardo Teixeira tem mandato até 2014 (ano da Copa no Brasil) e planos de presidir a FIFA a partir de 2015. Além disso, acumula o cargo de presidente do Comitê Organizador da Copa no Brasil (em que sua filha é a diretora-executiva). É ele que tem decidido junto das autoridades brasileiras o destino de bilhões de reais na construção dos estádios, por exemplo.

Embora tenha garantido em texto publicado na Folha de S. Paulo que a Copa no país do futebol seria bancada quase que integralmente pela inciativa privada, não há como negar a importância dos investimentos de governos municipais, estaduais e, principalmente, do governo federal. Há números que falam em mais de 98% da conta paga pelo dinheiro do contribuinte - o nosso.

A relação entre público e privado, como se vê, é bastante complexa na cabeça de Teixeira. Na bela reportagem da revista Piauí publicada em julho e assinada por Daniela Pinheiro (leia aqui), ele esbraveja: "Que porra as pessoas têm a ver com as contas da CBF? Que porra eles têm a ver com a contabilidade do Bradesco ou do HSBC? Isso tudo é entidade pri-va-da. Não tem dinheiro público, não tem isenção fiscal. Por que merda todo mundo enche o saco?".

Grande leviandade! A FIFA, para garantir seu lucro (estimado em 4,6 bilhões de dólares por mundial) e o de seus parceiros faz as mais variadas imposições. Entre elas, a isenção fiscal para todas as atividades que envolvam a Copa de 2014. A lógica é simples: para ser investigada, a Copa, a FIFA e a CBF são entidades privadas; para receberem dinheiro público são parceiras do governo brasileiro.

Mesmo que não falemos em uso de dinheiro público (o que não é o caso da CBF e da Copa, que se confundem na pessoa de Ricardo Teixeira), as empresas têm regras e leis a respeitar e detalhes a fornecer a diversos órgãos.

Ainda à revista Piauí, Teixeira deixou claro que o poder que ele concentra justifica qualquer arbitrariedade e retaliação. Diversos jornalistas e publicações são seus inimigos, seja abertamente declarado ou através das dezenas de processos abertos por ele (só contra Juca Kfouri já foram cinquenta): "É tudo coisa da mesma patota, UOL, Folha, Lance, ESPN, que fica repetindo as mesmas merdas". "Merdas" foi a palavra escolhida para resumir as denúncias de corrupção e enriquecimento ilícito.

Toda essa indiferença se completa com uma segurança inabalável: "só vou ficar preocupado, meu amor, quando sair no Jornal Nacional". Nesse ponto Ricardo Teixeira parece ter um pouco de razão. O maior grupo de comunicação do país costuma ser mais fiel aos seus interesses comerciais, como garantir as transmissões dos jogos do Campeonato Brasileiro e da Seleção, do que aos assuntos que correm o mundo. A TV Globo preferiu blindar o presidente da CBF em rara entrevista durante o processo eleitoral da FIFA, enquanto toda a imprensa esportiva mundial repercutia denúncias sobre pedido de propina em troca de apoio à candidatura da Inglaterra para a Copa de 2018.

Não são poucas as histórias de bastidores que vêm a público sobre demonstrações de força, ora por parte da Globo, ora por parte de Ricardo Teixeira. A mais emblemática, entretanto, é de 2001, quando o Congresso brasileiro fazia a CPI da Nike. Em um Globo Repórter (veja abaixo, em quatro partes), a emissora questionou o patrimônio de dirigentes, entre eles Teixeira, em comparação a seus rendimentos. A resposta foi rápida: o clássico Brasil x Argentina foi repentinamente remarcado para as 19h45. "Pegava duas novelas e o Jornal Nacional. Você sabe o que é isso?", revelou o nome forte do futebol brasileiro na mesma entrevista à Piauí.

A inevitável pergunta é: os rumos do esporte mais praticado e assistido do Brasil está nas mãos da pessoa certa? Ao que tudo indica, não. Ricardo Teixeira usa a CBF para demonstrar e ampliar sua influência, sem medo, e com constantes ameaças.

Fora das quatro linhas - para não dizer que também dentro delas - o que menos importa é o futebol. O capitão Ricardo Teixeira quer mesmo é levantar a taça de poderoso. 







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1) O jogo em que Ricardo Teixeira é o capitão.
2) Os contratos de transmissão no Brasil.
3) A história se repete. Chegou a hora de aprender com os hermanos.






      

24.10.11

Futebol para todos: muito além do grito de gol

Em tempos de preparação para a Copa do Mundo de 2014 e denúncias sem provas sobre o titular do Ministério dos Esportes, Orlando Silva, este blog prepara uma série de postagens sobre algumas questões que envolvem o esporte considerado paixão nacional, mais precisamente sobre suas politicagens e interesses.

Até que ponto as negociações das quais participam os cartolas são interesse privado?

Que poder a mídia brasileira exerce nos bastidores do futebol? E, principalmente: há motivos para pensar o futebol apenas dentro das quatro linhas?

Ainda que o Brasil seja realmente o país do futebol, o que podemos aprender com os demais?

Há diversas considerações a serem feitas antes que essas perguntas sejam respondidas.

Ricardo Teixeira preside a Confederação Brasileira de Futebol, a CBF, há 22 anos e parece fazer escola entre os clubes brasileiros. Dirigentes mantém-se no poder por sucessivos mandatos (quando há eleições) e permitem que até mesmo os torcedores mais desinteressados questionem se os interesses dos clubes está em primeiro lugar.

No país que vai receber os dois maiores eventos esportivos do planeta em três anos e que cresce economicamente distribuindo renda há pelo menos seis, os investimentos no esporte são inevitáveis. Quem cuida desse dinheiro?

A série reúne diversas informações sobre acontecimentos recentes e análises sobre esses temas que falam mais sobre politicagem e interesses duvidosos do que sobre paixão pelo clube ou esporte.

Aqui no Pra Escrever, a partir dessa semana!


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1) O jogo em que Ricardo Teixeira é o capitão.
2) Os contratos de transmissão no Brasil.
3) A história se repete. Chegou a hora de aprender com os hermanos.

19.10.11

#ClássicosEmSJ - Futebol e politicagem

Por melhor estruturada que seja e por mais audiência que tenha, a mídia esportiva brasileira gera mais conteúdo sobre politicagem do que sobre os esportes em si, especialmente o futebol.

Segundo esta matéria de O Dia que acabei de ler no NetVasco, o histórico estádio de São Januário continuará sendo preterido pelas forças de segurança pública do estado do Rio de Janeiro para a realização de  clássicos regionais, como o jogo contra o Botafogo pelo Campeonato Brasileiro que acontece daqui há quatro rodadas.

O Vasco, embora seja o único clube grande do Rio com estádio próprio é o que menos joga em casa. Eu, vascaíno, tenho o demérito de ter estádio. Os confrontos contra Botafogo, Flamengo e Fluminense, ainda que com mando de campo cruzmaltino, são obrigatoriamente realizados em estádios maiores e (supostamente) mais estruturados para um clássico.

São Januário tem capacidade para 19 mil presentes. A Vila Belmiro, estádio do Santos, tem capacidade para 15 mil e recebe clássicos contra o Corinthians e Palmeiras, por exemplo. Falta consenso entre as autoridades. 

A Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro, através do batalhão GEPE (Grupamento Especial de Policiamento nos Estádios), é quem desautoriza jogos no estádio do Vasco com a explicação de que São Januário não oferece segurança. Dúvida: se a PM é quem tem que garantir a segurança dos torcedores, não cabe ao Vasco a responsabilidade de provar que é possível. E mais: a realização de jogos no Engenhão ou no Maracanã não impediram a marcação de brigas entre torcidas em lugares distantes de onde o jogo seria realizado.

A entrevista do tenente-coronel Fiorentini é confusa. Ele tem pareceres relativos:

O acesso é complicado, a capacidade é pequena, e, se posso colocar um jogo com mais segurança no Engenhão, por que levá-lo para São Januário?

Honestamente não considero o acesso ao Engenhão mais fácil, tampouco seguro. Embora exista a estação de trem muito próximo ao estádio, não existem locais devidamente seguros para que as torcidas rivais possam se localizar sem encontrar-se. Além disso, mesmo sendo "contra-mão" São Januário e o seu entorno já fazem parte do cotidiano dos vascaínos que frequentam o estádio.

Outro argumento utilizado pelo tenente-coronel e que me reservo no direito de achar equivocado:

Um dos principais obstáculos é que no primeiro turno, quando o mando foi do Botafogo, o Vasco ficou com a metade da renda. Se o jogo fosse para São Januário, o Botafogo seria prejudicado porque só pode ter 10% de torcedores no estádio.

O (apenas) responsável pela segurança dos torcedores fazendo papel de cartola? O que este senhor tem de propriedade ou responsabilidade para falar sobre divisão de renda? Nada. E mais: que fique claro que a divisão igualitária da renda do jogo Botafogo x Vasco foi vantajosa para o time mandante, que tinha monstruosa inferioridade de torcedores em relação ao lado vascaíno, além de ser lógica e tradicional entre os clubes do Rio.

Por fim, ao comparar o caso da Vila e de São Januário, o responsável pelo GEPE fala que os jogos em Santos são autorizados por "questão de cultura". Ora, meu caro! Você não sabe que São Januário é um  dos estádios mais antigo desta cidade? Manter a "cultura" do santista jogar em casa, pode; a do vascaíno, não.

A autoridade do tenente-coronel Fiorentini é incontestável, mas quem gosta de futebol ou é vascaíno exige mais transparência e coerência em decisões como essa.

O Vasco, atualmente, é vice-líder do Brasileirão com a mesma pontuação do Corinthians, primeiro colocado. Temos chances reais de sermos campeões, assim como o Botafogo. Isso é suficiente para fazermos justa a realização, de fato, de um campeonato de ida e volta. 

#ClássicosEmSãoJanuário
#ClássicosEmSJ 

Em tempo: este simplório blog está preparando, para muito em breve, uma série de postagens em que vamos pensar e discutir o futebol brasileiro em um dos seus temas mais polêmicos: a transmissões dos jogos pela televisão. Mais politicagem, impossível. 
  

16.10.11

O futuro equivocado por dentro do "New York Times"


Este blogueiro que vos escreve gosta muito de cinema, embora entenda pouco (ou quase nada). Em tempos de Festival do Rio, montei uma lista de filmes que me interessavam sem atentar para diretores ou elenco, ficando focado apenas pela sinopse divulgada.

Dessa forma, escolhi com certo entusiasmo o filme "Primeira página: por dentro do New York Times", do diretor Andrew Rossi. O trabalho começa evidenciando os problemas que a publicação vem enfrentando nos últimos anos, sobretudo com perdas significativas em publicidade (valores pelo menos 30% menores de um ano para outro) e o crescimento das novas mídias e daquelas consideradas não-tradicionais.

Entretanto, o que se vê por dentro da redação do mais importante jornal dos Estados Unidos são demonstrações desnecessárias de poder e de ego de um outro diretor (inclusive em encontros promovidos para discutir o futuro do jornalismo em tempos de Internet) e demissões promovidas pela direção da publicação, justificada por questões financeiras - "Uma ação do Times custa menos do que uma edição de domingo", diz um dos entrevistados.

O filme nada mais é do que uma tentativa de fazer os espectadores acreditarem que mesmo em um novo mundo (em que a Internet e as técnicas de comunicação são fundamentais) a influência do jornal permanecerá. Há controvérsias.

A questão que talvez nem todos percebam (principalmente os ainda entusiastas desse jeito tradicional de produzir notícias, inclusive jornalistas) é que a própria fita dá os sinais das mudanças que vivem o jornal: mostra que, em 2001, ao publicar matérias sobre os armamentos nucleares no Iraque isso significou verdade absoluta na opinião pública estadunidense. O contraponto: sete anos depois, enquanto uma rede televisiva afirmava que a ocupação dos EUA no Afeganistão havia chegado ao fim, a redação do Times se encontrava perdida sobre como tratar um assunto que eles não dominavam.

Uma dos momentos finais do filme é um dos piores: "a notícia não vai morrer", diz um dos participantes do documentário ao garantir o futuro do The New York Times. A notícia vai continuar existindo, sim - com ou sem grandes jornais. Aliás, penso eu, quanto menos concentrada for a produção de notícia - leia-se: sem grandes corporações da informação - mais diversificadas serão as notícias que teremos sobre o mundo.

Já escrevemos (e pode ser lido aqui) que quanto menos dependermos dos grandes jornais e agências de informação, mais protagonistas existirão para que a notícia, uma interpretação dos fatos, possam surgir.

Quando morrem ou agonizam os grandes órgãos da imprensa mundial, a notícia vive.      

15.10.11

Questões locais, globais e sobre a Copa. E a soberania nacional?


Vivemos em um mundo globalizado (ou mundializado, como preferem os franceses).

Na visão fantasiosa que os poderosos querem impor, as tecnologias apresentam oportunidades, um mundo mais integrado e com distâncias espaciais e temporais reduzidas.

Um dos símbolos desse mundo globalizado são as empresas transnacionais, poderosas em várias áreas de atuação: do entretenimento ao mercado financeiro; da indústria alimentícia à automobilística. Consumir produtos dessas marcas, para muitos, é associar-se a elas e incluir-se na tal globalização.

A atuação imperialista e tirânica dessas corporações causa inevitáveis problemas por onde elas passam: desemprego, desrespeito aos direitos trabalhistas e ao meio ambiente, perda da identidade etc. Tudo isso justificado pelo lucro e pelas supostas "oportunidades de ouro" que as empresas oferecem aos estados nacionais, uma vez que recusar ou dificultar a atuação das empresas causa sua fuga. Há outros espaços em que elas podem se instalar sem que seja incomodada.

Outra característica da globalização é a homogeneidade imposta aos nossos costumes e consumo. Muitas vezes sem perceber, acordamos pela manhã e usamos produtos de higiene da estadunidense P&G, fazemos as refeições usando a suíça Nestlé, vestimos e calçamos a alemã Adidas, nos divertimos na noite bebendo cervejas da belga-brasileira InBev e ouvindo músicas do catálogo japonês da Sony. Por mais diversificado e cheio de opções que possa parecer, muito de nossas vidas é controlado por poucas corporações.

O processo com essas características se dá há décadas, mas começa a ganhar outras formas. Resistências têm explodido em todo o planeta há algum tempo. Um poder cada vez menos do Estado e cada vez maior das transnacionais é motivo de revolta, seja na América Latina ou na Europa - as desigualdades e injustiças nos unem, na medida do possível.

A FIFA, uma das mais influentes transnacionais conforme disse Juca Kfouri em artigo para a revista Interesse Nacional que está em seu blog e pode ser lido aqui, não age de maneira diferente. Usando e abusando da emoção que o futebol causa em todo o planeta (o marketing é ferramenta de ouro para qualquer corporação de grande porte no mundo) a entidade máxima do esporte impõe aos países-sede de seus eventos contratos, legislações e estilos de consumo. É o padrão-FIFA, caríssimo.

Para a Copa de 2006, na Alemanha, a força da Anheuser-Busch legitimada pelo contrato milionário com a FIFA não foi suficiente para impor que alemães e turistas consumissem no país da cerveja (a até então estadunidense) Budweiser. Por menos importantes que fossem nas grandes negociações globais, essas marcas locais conseguiram estabelecer-se com força e isso significa muito mais do que ter uma marca ou outra.

A força das ruas e do bom-senso mostra que por mais globalizado que esteja o mundo, ainda existe espaço para relações econômicas e de poder mais justas. Infelizmente, esse não é um caminho que estamos trilhando por aqui com relação à mesma FIFA.

Para a Copa de 2014 teríamos que deixar de lado legislações sobre meia-entrada para estudantes e idosos e sobre a proibição da venda de bebidas alcoólicas dentro dos estádios. Ainda que não faça sentido pelo clima que temos, os estádios brasileiros terão que ser cobertos (o que significa milhões de reais a mais nos orçamentos).

A soberania de um país cada vez mais importante no cenário internacional fica em xeque pelos desmandos dos senhores Teixeira e Blatter, sempre presentes nos noticiários internacionais por suspeitas e provas de sujeiras das mais diversas.

Esse tipo de análise não aparece na grande mídia brasileira, talvez pouco preocupada com a soberania do nosso país. Mais do que ficarmos orgulhosos por termos um evento desse porte em solo brasileiro, precisamos avaliar o que isso significa e qual preço pagamos.