30.1.12

Agora, com calma: revolta inevitável.




No calor dos acontecimentos, a gente deixa de perceber detalhes importantes ou mal consegue simplificar sentimentos.

Estando distante espacialmente de algo que nos choca, fica difícil entender o que acontecer de verdade.

Buscando informações em veículos de imprensa parciais, por mais capacitado que sejamos para distinguir o que pode e o que não pode ser aproveitado para formar nossa opinião, acabamos tendo pouco sucesso. Somos, portanto, mal informados e ponto.

A injustiça, o uso de forças de maneira desproporcional e dispensáveis em Pinheirinho não são, infelizmente, novidades no Brasil. No país da falsa democracia da informação, dos direitos básicos renegados aos seus cidadãos e da pobreza que é culpa do pobre, somos acostumados a viver os absurdos e a esperar a próxima situação extrema.

As equipes de televisão fazem poucas entrevistas com os moradores e, quando o fazem, são capazes de desacreditar homens e mulheres, pobres trabalhadores deste país. Há jornalista que prefere (tendo tempo para fazer boas entrevistas ao vivo sobre o tema) dizer que Pinheirinho estava dominada por um ou outro partido de "extrema esquerda", como se os pobres do Brasil fossem facilmente manipulados visando as eleições.

Dói ver brasileiros exibindo um punhado de roupas enquanto contam para jornalistas independentes as ações violentas que viveram e viram, a agilidade que tiveram que ter para retirar os pertences pessoais que podiam e o susto que levaram ao serem acordados em uma manhã de domingo.

Como se tudo já não bastasse, (mais) um banqueiro corrupto vai ser beneficiado em detrimento direto dos mais pobres deste país. Naji Nahas, através de sua empresa falida, recebeu da Justiça o direito de ter o terreno em que Pinheirinho foi criada há alguns anos para seu poder. O terreno deve cerca de 15 milhões de reais em impostos, mas vale 180 milhões e se tornará daqui há alguns anos a residências de outras famílias que possam pagar (caro) por um bom apartamento.

Até quando aqueles que detêm o poder da informação serão os responsáveis por filtrar quem vai ser entrevistado, podendo deixar de lado milhares de famílias? Os que sofreram o massacre em Pinheirinho não têm tido espaço sequer para chorarem suas perdas - em alguns casos, perdas de familiares e amigos.

É preciso que nós nos posicionemos e não tenhamos medo, vergonha ou autorrestrições de comentarmos e debatermos nas redes sociais, no cafezinho do trabalho ou na mesa do bar os absurdos sobre os quais tivermos informações. Informações essas que são cada vez mais bens preciosos a que poucos têm acesso.

Curta, compartilhe, escreva, critique, pergunte. Não assista, apenas. 

  

27.1.12

Para o PiG*, tudo se resume a política eleitoreira.

Ex-moradora de Pinheirinhos, dona Josefa chorou a reintegração de posse promovida pela Justiça e pela PM de São Paulo.
Foto: Reinaldo Marques/Terra.

Algumas pessoas se referem à Constituição de 1988 como Constituição cidadã. Por cidadão entendemos indivíduos que cumprem deveres e têm seus direitos respeitados. 

Depois de passados alguns dias da reintegração de posse do terreno de propriedade do especulador Naji Nahas (o banqueiro que faliu a Bolsa de Valores do Rio e foi preso em 2008 pela operação Satiagraha), os moradores da favela em São José dos Campos (SP) permanecem mal acomodados e sem garantias de terem acesso a moradias dignas enquanto outros optaram por fugir. 

Eram cerca de 6 mil moradores em Pinheirinhos. E a Polícia Militar chegou à favela com cerca de dois mil soldados. Casas foram destruídas, mesmo com móveis e pertences pessoais dentro; gás lacrimogênio e bolas de borracha foram utilizadas para conter as reivindicações e protestos daqueles que resistiam à decisão judicial; moradores denunciam o sumiço de amigos e familiares que foram levados a hospitais (veja aqui). A cidadania por aqui é assim.

Mônica Waldvogel, apresentadora do "Entre aspas", da Globo News, optou por discutir outros temas com o pano de fundo Pinheirinhos: "a discussão (sobre a reintegração) mostrou sinais de contaminação política". A jornalista, que faz parte do maior grupo de comunicação do país e tem na TV Globo uma programação diária com pelo menos cinco telenovelas de qualidade de conteúdo duvidosa, se acha suficientemente capaz de questionar o movimento de resistência dos moradores pelo fato de um partido, o PSTU, "liderar" a "ocupação ilegal".

É simples: exibir imagens de passeatas pelo país que protestam contra a corrupção usando cartazes "Fora Lula", pode; envolver partidos políticos na defesa de um direito básico dos brasileiros, não.

No mesmo programa Mônica parece se sensibilizar com a sinuca de bico a que os juízes paulistas foram submetidos. Para ela, os representantes da Justiça precisaram "cumprir a lei". Que lei, senhora Mônica? A mesma constituição que garante o direito de propriedade, garante o uso social da propriedade e o direito à moradia. 

O fato de a empresa proprietária do terreno - controlada por Naji Nahas - dever mais de 15 milhões de reais em IPTU não tem sido mencionado pelo PiG, assim como não se divulga devidamente que o atual valor de mercado do terreno é de 180 milhões de reais e que estamos acompanhado nada mais do que a ferocidade do evidente processo de especulação imobiliária.

Por outro lado, a imprensa noticiou saques e áreas em que os moradores consumiam crack - para o PiG, pobre consumir drogas é gravíssimo; o mesmo acontecer na Avenida Vieira Souto é detalhe.

Não há dúvidas de que a cobertura do caso tem um lado: o dos poderosos, embora a mídia use e abuse da falsa imparcialidade.

Moradia digna e preconceito
Para piorar a situação, li com revolta a reportagem da Folha de S. Paulo reproduzida pelo Blog do Nassif  (veja aqui) em que se questionava e denunciava a péssima qualidade de apartamentos populares entregues às famílias em dezembro de 2010 em Ribeirão Preto, interior de São Paulo. O diretor regional da CDHU (Companhia de Desenvolvimento de Habitação e Urbanismo), Milton Vieira de Souza Leite, explicou o porquê de rachaduras, janelas que não fecham e pias que vazam água:

- A gente conhece o nível de educação (dos moradores)... O pessoal veio da favela. Não está acostumado a viver em casa.

Sobre uma pia de cozinha que caíra após um dos moradores colocar sob ela uma cesta básica, a resposta foi:
- O que ele foi comer foi outra coisa.

Isso vai ficar impune, governador Geraldo Alckmin?

*O PiG (Partido da imprensa Golpista) é a denominação para toda a grande mídia brasileira, mais preocupada com o poder do que com a informação.A sigla foi criada e difundida por Paulo Henrique Amorim, do Conversa Afiada.





23.1.12

A Justiça é cega ou somos nós que fechamos os olhos para ela?

A ministra do STF e corregedora do CNJ Eliana Calmon: "Há bandidos de togas". 
Fotos de divulgação

O sistema político brasileiro é composto pelos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, todos equivalentes e dependentes dos demais para que o Estado brasileiro funcione. Em outras palavras: devem trabalhar juntos, discutindo aquilo que for importante para o Brasil e para os brasileiros.

A imprensa - que desde os meus tempos de aluno do Ensino Fundamental e Médio é classificada como o quarto poder deste país - parece fazer questão de confundir tudo. Dá sinais indiretos de que destes poderes, apenas o Judiciário pode ser respeitado. Os "políticos" são naturalmente suspeitos e têm perante o senso comum uma péssima imagem, enquanto os juízes e demais membros do poder Judiciário os controlam e prezam, como ninguém, pelo cumprimento das leis. Há controvérsias. Há cada vez mais controvérsias.

É assim que o jornalismo declaratório ganha cada vez mais espaço nos jornais, revistas e grandes canais de televisão, causando alarde na política brasileira mesmo sem provar nada. Por outro lado a atuação dos juízes e magistrados não é questionada, como se estes fossem isentos de erros, negociatas e desvios de conduta.

Recentemente, Eliana Calmon, corregedora do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), e sua atuação passaram a ser desqualificadas por colegas seus do Superior Tribunal Federal e associações de juízes. Frases polêmicas e posicionamentos radicais (na visão de poucos, mas poucos poderosos) têm causado discussões de naturezas muito variadas - e assim perdemos o foco daquilo que é mais importante: cobrar uma ação eficaz e independente dos órgãos do Judiciário brasileiro.

Não é difícil encontrarmos indícios de que a justiça tenha inúmeras vezes optado por ficado ao lado de quem pagou mais ou, no mínimo, de que interesses pessoais confundiram-se com o papel de homens públicos. Esses indícios são, para a ministra Calmon inaceitáveis e é assim ela parte para o enfrentamento e busca que os nomes de segunda instância e superiores deste país possam ser investigados por órgão independentes, quando for necessário.

- Os desembargadores não são investigados pela corregedoria. São os próprios magistrados, que sentam ao lado dele, que vão investigar.

Associação dos Magistrados do Brasil (AMB) já repudiou diversas vezes as palavras e ações da ministra, acusando-a, inclusive, de ter praticado quebra de sigilo ilegalmente. A resposta veio rápida e a reclamação não pôde ter mais eco entre a sociedade:

- Só posso lamentar a polêmica, que é fruto da maledicência e irresponsabilidade da AMB, da AJuFe (Associação dos Juízes Federais do Brasil), e da Anamatra (Asssociação dos Magistrados da Justiça do Trabalho), que mentirosamente desinformam a população ou informam com declarações incendiárias e inverossímeis.

E não parou por aí: quando chamada a explicar estas denúncias sobre investigação de funcionários do Judiciário e familiares, a ministra afirmou, pasme!, que 45% dos juízes do estado de São Paulo não declaram Imposto de Renda em 2009 e que em outro estado, no Mato Grosso do Sul, nenhum magistrado fez a declaração anual em 2009 e 2010.

Há algo de errado com a Justiça brasileira.

Vide a vergonhosa e violenta reintegração de posse do terreno onde se localiza a comunidade Pinheirinhos, em São José dos Campos (SP). Autorizada pela justiça paulista, mas considerada ilegal pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em virtude de acordo garantido pela justiça federal, já causou a morte de, pelo menos, uma criança de três anos. Há outras seis mortes ainda não confirmadas oficialmente, mas informadas pelos moradores locais.

A retirada à força de pelo menos 10 mil pessoas de suas residências já causaria indignação pelo fato de um direito básico da humanidade, a moradia, ter sido preterido pela garantia à propriedade privada. Entretanto, a justiça paulista - certamente não muito diferente dos demais estados - resolveu esquecer ou não perceber que a reintegração de posse foi solicitada pela massa falida de uma empresa do banqueiro ladrão Naj Nahas, preso pela operação Satiagraha da Polícia Federal.

Este blogueiro que vos escreve não pode provar, mas se mantém no direito de duvidar dos motivos que fizeram um juiz concordar com a retirada de milhares de famílias trabalhadoras em respeito à propriedade privada de um banqueiro corrupto.

Há algo de errado com a Justiça brasileira.   

22.1.12

A avaliação duvidosa e o medo do progresso

A Argentina de Cristina e Nestor Kirchner, responsáveis pelo crescimento econômico do país após anos do neoliberalismo de Menen, privatizações, desemprego em alta e inevitável crise que derrubou alguns presidentes, tem muito a ensinar aos brasileiros e demais países latinos no que se refere a regulação audiovisual e da comunicação

Celebrada pelos sindicatos, intelectuais e movimentos sociais de lá, a Ley de Medios ainda é constantemente atacada pelos grupos de mídia dos hermanos como o Clarín - a Globo deles - e essas críticas têm eco aqui no Brasil, via PiG*.

São cada vez mais frequentes os artigos ou matérias sobre a perseguição que a "imprensa independente" (?) recebe do governo. Parece que os grupos de mídia por aqui têm medo da onda progressista que pode tomar conta da América Latina, mesmo o Brasil tendo avançado tão pouco nos últimos anos.

Imprensa independente de que quem, amigo navegante? - copiando Paulo Henrique Amorim, do Conversa Afiada

Independente do povo argentino e dos seus anseios, só se for. O que o Clarín representava por lá pode ser chamado de qualquer coisa, menos de independência.

Este blogueiro que vos escreve esteve em Buenos Aires no mês passado e conversou com muitos portenhos. A imensa maioria não somente reconhecia os êxitos do casal Kirchner, como também o apoiava. Nessa viagem pude, ainda, comprar o livro "Ley 26.522 - Hacia un nuevo paradigma en comunicación audiovisual" em que diversos artigos demonstram a importância e a grandeza de lei aprovada por lá em 2010 após amplo debate entre governo e sociedade civil.

Capa do livro organizado por Mariana Baranchuk e Javier Rodríguez Usé.
Retirado do site GenteBA.

No livro, o brasileiro Dênis de Morais expõe números que facilitam a vida dos que duvidam que o Clarín seja a "imprensa independente" da Argentina:
"o Clarín controla 31% da circulação dos jornais, 40,5% da TV aberta e 23,2% da TV paga"
Informação não pode ser negócio e, muito menos, negócio controlado por poucos.

Para aqueles que temem o progressismo que alguns países latinos estão conhecendo, a democracia não diz nada. Desmerecem o êxito Nestor, a inevitável eleição de Cristina (que colunista convidado do PiG classifica como "transferência do poder") e sua reeleição com 54% dos votos em novembro passado.

É chegada a hora do enfrentamento democrático verdadeiro, que vai além das eleições e exige igualdade. A Argentina já deu os primeiros passos. Chegou a hora de segui-los.

*O PiG (Partido da imprensa Golpista) é a denominação para toda a grande mídia brasileira, mais preocupada com o poder do que com a informação. A sigla foi criada e difundida pelo Paulo Henrique Amorim, do Conversa Afiada.