19.8.12

Patrulhando piadas

A internet e as redes sociais transformam anônimos interessantes ou não em assunto para mais de um Trending Topic. 

De uma hora para outra, uma simples mensagem de 140 caracteres (ou menos) pode causar grandes transtornos e muita resenha. Aí surgem algumas celebridades instantâneas, que ganham seguidores e audiência. Em muitos casos, merecem tal sucesso virtual. 

É também na internet que muitas piadas ganham mais polêmica do que risadas. E aí, surge a tropa de humoristas mais rápida da rede: "pessoas mal humoradas", "hipocrisia", "muito alarde por pouco". Os setores da sociedade que sentem-se atingidos por uma piada mal pensam em se manisfestar e já se ouve/lê respostas a isso.

Alguns humoristas sentem-se no direito de invadir a rede, a TV e criar casos, mas querem passar ilesos a tudo isso.

Negros, mulheres, evangélicos, nordestinos... Nenhum grupo que sinta-se mal por ver piadas de mal gosto ou esteriótipos sendo reafirmados podem sentir-se atingidos. Tudo em nome do humor. Detalhe: quem ganha com toda essa liberdade são os próprios humoristas; aos setores da sociedade cabe apenas a condição de aceitarem e "rirem de si mesmos". Do contrário, são vistos como meros patrulheiros de piadas e até mesmo cerceadores da liberdade de expressão.

Tem sido comum o discurso de que tais grupos reclamam demais, têm exagerado. Pouco se fala sobre o exagero dos humoristas.

Vigiar, classificar e perseguir piadas e humorista é desnecessário e atrasado, mas esses que sentem-se perseguidos pelo "politicamente correto" das minorias talvez precisem refletir um pouco e, sim, pensar em limites a si mesmos. Ou, pelo menos, pedir desculpas quando necessário. Leis e punições da chefia não resolvem. O que falta mesmo é bom senso.

É difícil encontrar algo mais interessante na internet do que assistir a vídeos-esquetes ou trechos de programas com belo senso de humor. Rir é um belo negócio. Uma crítica ácida e que crie mal estar é muito bem-vinda, mas acho que há casos pertinentes e outros totalmente desnecessários.

Veja esses dois casos:

Há duas semanas, comentando a apresentação do Rio como próxima cidade das Olimpíadas, o twitteiro @rafucko fez a seguinte postagem: "O Brasil é lindo! Pena que a gente só exalta o gari, o índio, o Simonal e a religião afro-brasileira qdo tem inglês vendo. Aqui a gente mata". Foi no ponto e causou incômodo naqueles que são preconceituosos. Essa mensagem não pôde ser retuitada por aqueles que "matam" índios, pobres e negros por aqui, pois pessoas assim é que estão sendo criticadas e não as pessoas que "morrem".

Caso oposto é o do humorista e sua piada sobre o King Kong. A história é bem requentada, mas vale o registro. Em 2009, quando ainda fazia parte do elenco de "CQC", Danilo Gentili fez a seguinte postagem: "King Kong, um macaco que, depois que vai para a cidade e fica famoso, pega uma loira. Quem ele acha que é? Jogador de futebol?".

Em pouco tempo o tweet virou polêmica. Chegou ao Ministério Público Federal de São Paulo, tendo tido o caso arquivado.

Não sou especialista em humor, tampouco humorista. Não pretendo ser crítico da piada em si, mas sinto-me no direito de pensar sobre tais palavras, uma vez que estes senhores entram com suas piadas em nossas casas, mesmo que a TV esteja sintonizada na concorrência. Vira polêmica e, em seguida, debate na mesa do bar, tema de discussões em programas de TV mais sérios, aumenta "conflitos" pela grande rede etc.

Aliás, depois da consequência à polêmica, o humorista publicou uma carta em que, veja!, os preconceituosos eram os que ligaram "macaco" e "jogador de futebol" à figura do negro brasileiro que ascende economicamente. A plateia que riu da piada (ou deu simples RT) não foi racista. Racista, segundo Gentili, foi quem achou a piada equivocada e preconceituosa.

O fato é que, ao contrário da mensagem do twitteiro @rafucko, essa piada pode ser usada pelos que, de fato, são preconceituosos. Não se trata de usar termos como "preto" ou "negro", mas de que (outros) usos a piada pode ter. Os que vieram/virem a usar a piada do King Kong com intenção racista o farão, sem constrangimento.

Para terminar, indico dois vídeos.

O primeiro é entrevista completa de Rafinha Bastos no programa "Roda Vida". Sou fã do Rafinha desde os tempos da "Página do Rafinha", quando vídeo exibido pela grande rede era tão raro quanto computadores nos lares brasileiros. Vale a pena assistir para melhorar o debate e não vermos argumentos vazios por parte dos humoristas.

Já o segundo vídeo é do ator Paulo Gustavo. No ar com "220 volts" no canal fechado Multishow e em cartaz com as peças "Hiperativo" e "Minha mãe é uma peça", o ator tem uma das personagens que mais me faz rir: é preconceituosa ao extremo, reclama de qualquer minoria e usa quase que ao pé da letra o discurso daqueles que assim são na vida real, mas com detalhe: a personagem é ridicularizada por pensar dessa forma, tanto que chama-se Senhora dos Absurdos.

Assista e ria (e indigne-se) sem medo.